Cada vez mais nesta terra ser professor é ser tratado como um cão.
(Sem pedigree, entenda-se!)
O professor não é um profissional, não é um funcionário, não é um cidadão, em última análise não é sequer um indivíduo com estatuto reconhecido.
Motivo por que fiquei tão feliz ao ler as notícias que saíram por aí, por uns lados e por outros, depois da publicitação dos resultados últimos do concurso de colocação de professores.
Segundo elas, o Ministério da Educação decidira alargar o prazo para a aceitação de colocações por parte dos professores, materializada na sua apresentação nas escolas calhadas em sorte no concurso.
Porque, que diabo, havendo tantos professores de férias, o prazo bem que poderia ser alargado até ao final de Agosto (para os mais ignorantes, por definição o final das férias dos ditos).
O Senhor Secretário de Estado Jorge Pedreira deu a boa nova - tudo (sic) "para que não se prejudiquem os docentes " - e eis que os media correm lampeiros a replicá-la por espasmo para deleite de um País de pachorrentos.
...Mas lamento ter de estragar o quadro bucólico.
É que eu não tenho nada a agradecer a alguma gente que supostamente me tutela.
Por se tratar de alguma gente que se arrasta errática pelo Ministério, ignara e ignava, suportada pelos meus impostos, sustentada pelo meu trabalho no terreno, e que se permite contra todas as expectativas tratar-me como um boneco de corda.
(Deixo, contudo, a importante ressalva de que, da mesma maneira escrupulosa, com a mesma alva candura com que a Senhora Ministra da Educação separa nas suas imprecações os bons professores dos que clamam pelas suas verdascadas, assim preservo no meu coração os virtuosos do Ministério da condenação que faço da corja que aqui retrato...)
Porque vamos lá chamar as coisas pelos nomes.
Os resultados de colocação divulgados no site do Ministério, foram acompanhados da publicitação simultânea de "Documentação de suporte ao concurso", nomeadamente da "Nota de publicitação das listas definitivas das necessidades residuais (destacamento para a educação especial, destacamento por condições específicas, destacamento por aproximação à residência, afectação e contratação)" com data de 18/08/2006.
No documento, podia claramente ler-se:
"12 – Os candidatos colocados por destacamento, afectação e contratação devem manifestar a aceitação da colocação no prazo de quarenta e oito horas, correspondentes aos dois primeiros dias úteis seguintes ao da publicação da respectiva lista, conforme o estabelecido no n.º 5 do artigo 20º e n.º 1 do artigo 58º, do Decreto-Lei acima mencionado.
13 – Sempre que a apresentação não possa ser presencial por motivo de férias, maternidade, doença ou outro motivo previsto na lei deve o candidato colocado, por si ou por interposta pessoa, comunicar o facto ao estabelecimento de ensino, com apresentação, no prazo de cinco dias úteis, do respectivo documento comprovativo designadamente atestado médico ou optar pelo envio, até ao último dia do prazo, da declaração de aceitação através de correio, registado com aviso de recepção, com apresentação, no prazo de cinco dias úteis, do respectivo
documento comprovativo designadamente atestado médico, nos termos do nº 2 do artigo 58º do
Decreto-Lei nº 20/2006, de 31 de Janeiro."
Isto é: "mal saídos os resultados das colocações, ala!, deixa-te disso de férias e não sei mais quê e volta a toque de caixa que não tens direito a essas finuras veranis".
Logo, e por saber que segundo o Murphy da Educação nacional "tudo o que pode correr mal vai correr pessimamente", professores houve que zarparam das suas férias rumo às escolas, pesando a segurança do "comunicar por correio" a aceitação do lugar (sem a mínima indicação do conteúdo formal de uma hipotética carta deste género), de o fazer "por interposta pessoa" (!!!), a gravidade de uma má decisão:
("15 – O não cumprimento dos deveres de apresentação é considerado, para todos os efeitos
legais, como não aceitação da colocação, determinando a anulação da colocação obtida, a
exoneração automática do lugar em que o docente esteja provido e a impossibilidade de, no
respectivo ano escolar, o docente ser colocado em exercício de funções docentes em
estabelecimento de educação ou de ensino público" )
e a boa-fé useira deste Ministério - eventualmente presente na coincidência da saída dos resultados numa boca de fim-de-semana, vedando aos docentes o contacto com escolas, serviços do Ministério ou seus sindicatos, para pedidos de esclarecimento e apoio.
Portanto, o que tenho eu a agradecer ao Ministério e, em particular, à Ministra da Educação?
Os quinze dias (quinze dias!!!) de avanço da saída dos resultados este ano sobre a divulgação do ano passado?
O que é que o País tem a agradecer-lhes e à maneira selvagem como trata a Educação e seus agentes? - bem entendido, o País interessado, que não está zombie a ver passar o Governo.
Ao alargar-se no prazo em causa, o Ministério da Educação fê-lo na 2ª feira dia 21, três dias após da publicitação das listas, a um dia do termo do prazo para a apresentação dos professores nas escolas, e desmentindo o texto que o próprio Ministério publicitara como "Documentação de suporte ao concurso"!!!
Se isto não é brincar, o que é?
Se não é gozar com os professores e com o Ensino, o que será?
...E ninguém vê? Ninguém diz nada?
Já não digo os miseráveis dos sindicatos (eu já lá vou...), nem a patética informação dos media que sob nenhum formato elege os escândalos da Educação como minimamente relevantes.
Mas o cidadão normal, comum.
O que paga e cala, o que trabalha e cala, o que manda os filhos para a escola e cala, qualquer português que (mesmo não dependendo do ensino público para os seus filhos) vai sentir rebentar esta castanha na boca mais tarde ou mais cedo - porque é por aqui que se afunda ou salva um País!
Esse, o que é que diz? Nada?...
...É que quem fica calado, merece tudo o que vier a acontecer-lhe.
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