02/10/06

Identidades

Parece que há quem queira levar o PS a reflectir sobre a sua "identidade".

Não me parece mal.
Reflectir nunca fez mal a ninguém e muito menos sobre "a sua identidade"...

Acontece que no PS isso não vai acontecer. Ponto.

Nunca num partido em mó de cima se "reflecte sobre a identidade".
A "crise de identidade" é apanágio de quem está na mó de baixo, nas ruas da amargura de enxertos eleitorais sem terapêutica de recuperação à vista.
Quem tem o Governo na mão não tem angústias dessas, quem é maioria absoluta (!!!) democraticamente delegada, só começa a angustiar-se uns três anos e meio depois de ser eleito.
Por isso, a "reflexão sobre a identidade" não vai acontecer, porque organicamente o PS não precisa dela.

Quer isso dizer que no PS não faz sentido reflectir sobre a identidade do partido, porque sabe muito bem quem é?
Aí, não exageremos...

O PS hoje é uma empresa de sucesso graças a um gestor competente dos seus recursos.
Mas politicamente - já agora, se não fosse pedir muito, uma vez que se trata de um "partido político" - é uma enxertia caprichosa e mirabolante num pé político estafado e serôdio.
O PS é hoje, por excelência, o partido político português da crise de identidade.
...A todos os outros partidos parlamentares, de cabo a rabo, poder-se-ia sim recriminar o imobilismo, a pretensa adaptabilidade de fórmulas práticas na verdade estafadas e desajustadas. Mas sempre "idênticas" e identificadas.

Mas da "variedade socialista" já não colhe o retrato do admirável caldeirão de culturas, da mescla alquímica de sensibilidades políticas, da teia de tensões em perfeito equilíbrio que lhe confeririam variedade, riqueza e até estabiliadade.

Transformado numa plataforma utilitária para a concretização remota de um projecto transversal, a governação "socialista" da Nação, o PS atingiu o maior sucesso legislativo que já conhecera - a maioria absoluta.
Mas pagou-o na factura de uma cisão profunda entre os pós-modernos - que desdenham de uma história política de décadas mas sabem que é ela que valida aos olhos do País as pretensões actuais e futuras ao poder do partido - e os históricos - que desdenham a vacuidade das figuras de proa de um socialismo sem alma mas que reconhecem os frutos de um pragmatismo dúctil.
Uma cisão que se manterá por tanto tempo quanto durar este projecto pós-moderno socialista em vida política útil dos seus "pais fundadores".

Qual a novidade do episódio presidencial Alegre?
Qual a surpresa desta ânsia pela "definição de identidade"?

Todos no PS estariam interessados em resolver de uma vez por todas a questão da "identidade".
Fosse por varrer o lixo para debaixo do tapete, fosse para encostar definitivamente à box quem, de parte a parte, é considerado um handicap para a realização do "socialismo português do século XXI".

Acontece que isso no PS não vai acontecer. Ponto.

1 comentário:

Anónimo disse...

pois... e eu que esperava por um pouco de divertimento... enfim, já me resignei. quanto à parte do ponto e ao resto, estamos em consonância.
GOSTEI MUITO.